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Folha de S.Paulo, 11/08/2016 |
Sidney Molina |
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Recital de Jonas Kaufmann prima pela contenção e pela
delicadeza
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Em "A Tília", canção de Schubert (1797-1828) que fechou, na quarta (10), na
Sala São Paulo, o primeiro bloco do recital do cantor Jonas Kaufmann com o
pianista Helmut Deutsch, ficou evidente que não estávamos apenas conferindo
as qualidades vocais de um dos mais importantes tenores da atualidade.
Era pura música de câmara – gênero em que o mínimo sonoro pode trazer o
máximo de sentidos–, um jogo complexo entre poemas entoados e notas puras do
piano. Como mostrou o pesquisador Ticiano Biancolino, essa canção começa com
um "chamado de trompas", o piano evocando a distância do tempo feliz
perdido, cantada pelo poeta.
Kaufmann tem muitos recursos vocais. São
pianíssimos de múltiplas cores, controle total da respiração, a capacidade
de dar acabamento timbrístico próprio a cada região vocal, e uma escuta
harmônica –a reação imediata às nuances do piano de Deutsch. A não ser em
raros momentos dos vários bis, não soltou a voz –como faria diante de uma
orquestra num teatro de ópera–, nunca se sobrepôs ao piano. Contenção e
delicadeza foram a tônica do espetáculo, como na terna "Phidilé", de Henri
Duparc (1848-1933), que encerrou a primeira parte.
Os "Três Sonetos
de Petrarca", de Liszt (1811-86), talvez tenham sido o ponto culminante do
trabalho musical do duo. Cantados em italiano, recebem do compositor uma
forma na qual, frequentemente, há nítida separação estrutural entre os
quartetos iniciais e os tercetos finais dos poemas.
Mas é a
ambiguidade harmônica, a capacidade de alterar a direcionalidade dos acordes
- junto à repetição precisa de certos versos–, que permite a Liszt traduzir
o impacto do momento em que o poeta do século 14 fora tocado pelo encanto da
amada. Do mesmo nível foram as interpretações de seis canções de amor
–como "Pra quê, Menina" op. 19 n.1 e "Cecília" op. 27 n.2"" compostas por
Richard Strauss (1864-1949), que encerraram o programa.
O recital de
Kaufmann e Deutsch celebrou os 35 anos do Mozarteum Brasileiro, instituição
sem fins lucrativos que, ao lado de séries anuais de concertos com músicos
de destaque internacional, organiza e dirige atividades educacionais e,
desde 2012, também o Festival de Música de Trancoso, na Bahia.
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